sexta-feira, 23 de julho de 2010

ele levou-te e tu não me disseste nada!

Fui passear. Parei naquele banco da avenida como sempre acontecia quando saíamos juntos. Estive lá horas e horas. Em silêncio. Sabes o que fui capaz de ouvir? O barulho dos carros, o vento, as pessoas que passavam, o absoluto barulho de uma cidade em fúria. Parece estranho, mas nunca tinha ouvido isto antes. E tu? Tinhas?
Sei bem que não. Se tal tivesse acontecido, terias-me dito. S
enti tantas diferenças! Senti coisas estranhas no ar. Senti que estavam ali presenças estranhas e que me pediam ao ouvido para entrar no meu espaço. Mas eu, eu não consegui dizer nada, sentia-me perdida.
Sabes, nem sempre consigo entender o porquê de me fazeres tanta falta. Não sei o porquê de as coisas serem assim.
A certa altura, tive medo. Medo dos barulhos que ouvia, das vozes que me falavam do longe, das intrigas dos carros e do vento forte da noite. Tive medo! E isto tudo porque tu não estavas lá sentado ao meu lado a proteger-me do que podia acontecer.
Quando olhei para o relógio, o meu tempo estava quase a esgotar-se, faltavam poucos minutos para que o meu percurso estivesse no fim. Mas ainda havia tempo para uma explicação, mais uma.
Sabes, quando estavas comigo naquele banco da avenida não havia mundo à nossa volta. Tu era eu e tu, tu e eu. E é por isso, tenho a certeza, é por isso que eu não sentia o barulho da cidade, foi por isso que nunca ouvi as vozes a chamarem por mim, foi por isso que nunca vi a luz ao fundo da rua, foi por isso que nunca tive medo. Lembraste quando aquela criança veio ter connosco a pedir comida? Lembraste do que te disse baixinho antes de ela dizer o que fosse? "Adoro os olhos dela! Quero uma filha assim!". Lembraste do que me respondeste? "Eu dou-te uma filha assim!". E eu sorri. Confesso-te agora que tive um certo medo do que poderia surgir depois dela, achei que os pais poderiam achar que lhe estaria-mos a fazer mal, mas contigo eu estava segura! "Menina, preciso de ajuda! Quero comer!". Sabes bem que o meu coração bateu mais rápido que nunca, sabes bem que eu fiquei sem forças e só não morri porque ela precisava de ajuda. O meu instinto maternal falou mais alto, levantei-me co
mo se tivesse perdido aquele medo que te confessei anteriormente, dei-lhe a mão e levei-a a jantar. Tu quiseste ficar ali sentado e eu não me importei nada. Dei-lhe tudo o que ela queria, dei-lhe até um boneco e roupa quentinha, dei-lhe mimo e muitos beijinhos. Chamava-se Matilde, o nome que tinha-mos pensado dar à nossa filha!
Quando voltei, sentiste que vinha radiante. Como se aquela menina fosse a nossa filha e eu tivesse feito dela a menina mais feliz do mundo! Lembro-me que a única coisa que me disseste foi "És fantástica!" e eu dei-te um beijinho na testa e fiquei ali agarrada a ti, a ver as estrelas.
Contigo sempre foi assim, segurança sem limites. O teu amor era à prova de balas, por isso é que eu nunca tinha medo.
Voltei a olhar o meu relógio. O tempo mostrava-se ainda mais curto, ainda mais próximo do fim.
Apenas tive tempo de relembrar o caminho de volta a casa. Quando me levavas pela mão como se eu fosse uma princesa, quando me dizias aos berros "Eu amo-te mulher da minha vida!", quando cantavas comigo as músicas que eu mais gosto, quando me levavas às cavalitas como se eu fosse a tua filha e cuidavas do meu corpo com todo esse cuidado! Era maravilhoso recordar esses momentos todos, era maravilhoso sentir tudo a voltar atrás, era maravilhoso poder ver as imagens da minha cabeça a voltar atrás, era maravilhoso conseguir ouvir no meio dos ruídos da cidade a tua voz. Era maravilhoso sentir-te.
Mas tudo não passava disso. Não passava de recordações!
O meu corpo arrepiou-se com o passar de um brisa mais fresca. Senti como se as tuas mãos me estivessem a agarrar o corpo, como se me estivesses a dizer "Estou aqui. Agora podes ir!". Olhei para todos os lados: não eras tu. Vento manhoso que me quis fazer crer de que eras tu.
O meu relógio! Tinha-me esquecido dele. Tu sabes tão bem como sou assim, distraída com tudo, menos com o amor.
Estava na hora crucial. Tinha de ir embora. Tinha de voltar a percorrer o caminho.
Levantei-me e ainda mais uma dúvida me surgiu na cabeça. Olhei em frente e pensei: não tenho mais tempo, tenho de seguir a luz ao fundo, não posso ficar presa aqui. E fui. Meia louca, meia sem rumo, meia sem saber o que fazer. Apenas sigo a luz, sei que no fundo tu lá estarás à minha espera, eu acredito!
Mas a dúvida continuava, a dúvida continua: o que se terá passado contigo para te teres ido embora sem mim e quebrando as promessas de uma vida inteira?


Eu sei meu amor, a culpa não foi tua. Foi daquele maldito acidente que te levou!

5 comentários:

  1. uau, está lindo :o
    sim, aquela sou eu minha querida :$

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  2. eu comecei a ler aquele livro à mesmo pouqinho tempo mas estou a gostar muito :)

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  3. q arrepios assustadores! quem sabe n descobres alguém q encontre outro banco na avenida e te proteja de td o resto:)

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  4. ohh a sério? *.* que giro! por acaso se há coisa que gosto em mim são os meus olhos. por isso também gosto dos teus :)

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Posso não concordar com nenhuma das palavras que tu disseres, mas defenderei até à morte o direito de tu as dizeres.
Voltaire